Caso Raposa/Serra do Sol - proporcionalidade extensiva

Demarcação de Terras Indígenas: Raposa/Serra do Sol - SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

O Ministro relator, Carlos Ayres Brito se convenceu de que:

O Tribunal iniciou julgamento de ação popular ajuizada por Senador da República contra a União, em que impugna o modelo contínuo de demarcação da Terra Indígena Raposa/Serra do Sol, situada no Estado de Roraima, e pleiteia a declaração de nulidade da Portaria 534/2005, do Ministro de Estado da Justiça, e do Decreto homologatório de 15.4.2005, do Presidente da República. Sustenta o autor, em síntese, que a Portaria em questão possuiria os mesmos vícios da Portaria 820/98, que a antecedeu, em razão da não observância das normas dos Decretos 22/91 e 1.775/96, haja vista que não teriam sido ouvidas todas as pessoas e entidades afetadas pela controvérsia, e o laudo antropológico sobre a área em discussão teria sido assinado por apenas um profissional, o que seria prova de presumida parcialidade. Alega, também, que a reserva em área contínua traria conseqüências desastrosas tanto para o Estado de Roraima, sob os aspectos comercial, econômico e social, quanto para os interesses do País, por comprometer a segurança e a soberania nacionais. Argumenta, por fim, que haveria desequilíbrio da Federação, já que a área demarcada, ao passar para o domínio da União, suprimiria parte significativa do território roraimense, ofendendo, ademais, o princípio da razoabilidade, ao privilegiar a tutela do índio em detrimento, por exemplo, da iniciativa privada.
No mérito, o relator julgou improcedente o pedido formulado, para assentar a condição indígena da área demarcada como Raposa/Serra do Sol, em sua totalidade, pelo que fica revogada a liminar concedida na ação cautelar 2009, devendo-se retirar das terras em causa todos os indivíduos não-índios


I – toda a área referida pela Portaria nº 534/2005, do Ministro de Estado da Justiça, é constituída de terras indígenas, como conceituado pelo § 1º do art. 231 da CF. Terras indígenas contíguas ou lindeiras, ainda que ocupadas, em grande parte, indistinta ou misturadamente por cinco etnias, por forma tradicional e permanente em face do marco temporal do dia 5.10.88, conforme demonstração convincentemente feita pelo laudo e pelo parecer antropológicos, e em nada descaracterizadas pelo fato das posses ilegítimas que se deram com maior vigor no século XX;

II – em que pese a demarcação não observar o vetor monoétnico para a definição dos limites das várias terras indígenas lindeiras que formam toda a área conhecida como Raposa/Serra do Sol, de tal circunstância nenhum prejuízo resultou para os índios das cinco etnias em comento, motivo, aliás, da inexistência da irresignação de membro individual ou órgão representativo de qualquer das comunidades envolvidas, o que se explica:
a) pelo fato da intensa e antiga miscigenação entre os seus componentes;
b) pela concreta dificuldade de precisa identificação da área de movimentação física de cada uma dessas tribos ou etnias autóctones;

III – a extensão da área demarcada é compatível com as coordenadas constitucionais, sobretudo à vista do postulado da proporcionalidade extensiva, sendo de se enfatizar que a demarcação de terras indígenas não se orienta por critérios rigorosamente matemáticos, e que as próprias características geográficas da região contra-indicam uma demarcação avara ou restritiva, pois a reconhecida infertilidade dos solos (causadora da necessidade da prática da coivara e da pecuária extensiva), os períodos de cheias e a acidentada topografia da região já são em si mesmos um contraponto ao generoso querer objetivo da Constituição em matéria de proteção indígena.
Pet 3388/RR, rel. Min. Carlos Britto, 27.8.2008. (Pet-3388)

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