A democracia na era dos MBA's

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Versão original publicada no dia 24.10.12,  no Harvard University Press Blog
Traduzido por Carlos Luiz Strapazzon, em 12.11.12

Há pouco tempo atrás a Harvard University Press publicou o premiado livro de Mark McGurl que abordava a literatura dos Estados Unidos: The Program Era: Postwar Fiction and the Rise of Creative Writing. O livro destacava como a crescente popularidade de criativos programas de Pós-graduação começaram a moldar o modo de fazer literatura de ficção dos Estados Unidos. Contra os que deploram a uniformidade do chamado “MFA Style” (Master of Fine Arts), trazido para a literatura norte-americana, McGurl argumenta que a cultura literária desta geração de estadunidenses é rica, profunda e, às vezes, até brilhante, mas que a força dessa educação superior massificada desempenha uma função constitutiva desse novo fenômeno literário e que precisa ser melhor entendida: 

Precisamos começar a documentar esse fenômeno, saindo dos célebres casos dos escritores do Workshop de Iowa e da Universidade de Stanford e de alguns outros, para captar a realidade de um empreendimento que, atualmente, tem quase 350 colaboradores institucionais e continua a crescer. Esse empreendimento está fazendo a história literária dos Estados Unidos.  

Então está bem. Ótimo livro, muito boa leitura. Você deveria consultá-lo. Mas hoje vamos imaginar essa perspectiva do livro de Mark McGurl aplicada a um outro programa de Pós-graduação, igualmente onipresente, e que vêm, do mesmo modo, estabelecendo uma particular forma de ver o mundo: são os Master of Business Administration

Este ano nós vimos o que um cínico poderia chamar de a maior ação de marketing de guerrilha da indústria dos MBA’s: a candidatura de Mitt Romney, seguramente o mais celebrado MBA do mundo atual. 

A dedicada atenção de Romney à economia, ao longo de toda a campanha, é uma ampla exposição do MBA style of thinking. E o que fascinou muitos observadores é o modo como esse modelo de pensamento foi reapresentado. Romney defendeu que as competências e conhecimentos exigidos para dirigir um negócio são os mesmos que se exige para governar um país. As pesquisas de opinião, de certo modo, confirmavam que ele tinha razão.  

Mas por que esperar? Vamos tomar o estilo de abordagem de McGurl e imaginar um livro sobre “a Era dos Programas de MBA”. O que esse livro nos ensinaria sobre esse tipo de treinamento educacional e suas práticas? Talvez ele nos ajudasse a pensar sobre o impacto de um pensamento que olha para todas as coisas como se elas fossem, necessariamente, parte de um mercado a ser explorado, e poderia ajudar compreender a perspectiva segundo a qual 30.000 mortos na Syria pode ser considerado uma “oportunidade”, como Romney descreveu a situação durante os debates eleitorais

Ok, vamos falar sobre o que ocorre na Syria e da importância desses acontecimentos. Primeiramente, 30.000 mortos pelo governo deve ser entendido como um desastre humanitário. Em segundo lugar, a Syria é uma oportunidade para os Estados Unidos, porque têm um importante papel no sistema político do Oriente Médio, particularmente agora. 

A questão do mercados é o tempo, certo? Comprar barato, vender caro. Dá pra notar o espírito dos comentários do governador sobre a necessidade de armar, rapidamente, as forças de oposição da Syria, apesar da longa história de treinamentos e de fornecimento de equipamentos aos rebeldes estrangeiros, pelos Estados Unidos, e que mais tarde acabarão sendo empregados contra os interesses dos Estados Unidos.
 
Há uma clara contradição aqui, que talvez o livro The (MBA) Program Era poderia nos ajudar a compreender.  Por exemplo: por que o MBA-candidate é o único tão insatisfeito com a eficácia das sanções econômicas. Ou por que os políticos são tão cegos diante da tragédia humanitária dessas sanções? , como se a economia existisse como uma entidade à parte, distinta da vida que há nela. Mesmo se nações fossem simplesmente negócios, essas sanções nos estimulariam a pensar se os empresários não deveriam entender que pressionar uma empresa é um modo de atingir os trabalhadores antes do que os seus proprietários, e que sanções a nações causam sofrimento ao povo, mais do que a seus líderes. Certamente os CEOs da American Fortune 500 —que vão muito bem, mesmo que depois da crise ainda não tenha recontratado os trabalhadores demitidos naquelas circunstâncias—poderiam explicar isso. 

Nós precisamos começar a documentar esse fenômeno, saindo um pouco dos célebres casos da Harvard Business School, Wharton, Sloan e algumas outras para captar a realidade de um empreendimento que já soma mais de 4.000 instituições participantes, e que continua a crescer. Esse empreendimento está fazendo a história das nossas lideranças. 

Versão original disponível em: http://harvardpress.typepad.com/hup_publicity/

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