LULA e o COMITÊ DE DIREITOS HUMANOS DA ONU
Lula tem direito de petição individual ao Comitê de DDHH em caso de Violação de Direitos Civis e Políticos.
De
fato, o Brasil Ratificou adesão ao Protocolo Facultativo do Pacto de
Direitos Civis e Políticos, na ONU. Isso foi em 2009.
Basta
ler o Art. 1o do Protocolo Facultativo para ver que o País
que Ratifica esse Protocolo aceita a Competência desse Comitê da
ONU.
Note
que essa adesão do Brasil ao Protocolo é “facultativa”.
Em
2005, o Ministério das Relações Exteriores encaminhou à
Presidência da República o pedido de adesão do Brasil a esse
Protocolo Facultativo. E a Presidência da República manteve as
mesmas razões que vieram do Ministério das Relações Exteriores
quando encaminhou o pedido ao Congresso Nacional.
E
lá está escrito o seguinte:
O
Brasil já reconhece a competência para o exame de casos individuais
por parte de importantes órgãos internacionais de direitos humanos,
nos âmbitos global e regional, como a Comissão e a Corte
Interamericanas de Direitos Humanos, o Comitê para a Eliminação da
Discriminação Racial e o Comitê para a Eliminação da
Discriminação contra as Mulheres. O reconhecimento da competência
do Comitê de Direitos Humanos para examinar petições de indivíduos
que aleguem ser vítimas de violações dos dispositivos do Pacto
Internacional de Direitos Civis e Políticos representaria o
aprofundamento dessa vertente da política brasileira de direitos
humanos (Diário do Senado Federal - 19/6/2008, Página 21437,Exposição de Motivos).
No
caso Lula, o Comitê da ONU expediu, em 17.08.18, uma Nota em caráter
de “medida temporária”, requisitando que o Brasil franqueie a
Lula a possibilidade de exercer seus direitos políticos nas eleições
deste ano.
O
Brasil deve “tomar as medidas necessárias para garantir que Luís Inácio Lula da Silva possa exercer seus direitos políticos enquanto estiver na prisão, como candidato às eleições presidenciais de2018”, diz o documento.
O
Itamaraty, também em nota pública, afirmou que esse comunicado não
é de cumprimento obrigatório, e disse levar o caso à Justiça
brasileira.
É
verdade que o Protocolo não prevê a possibilidade de "Medidas
Cautelares/Provisórias/Temporárias". Com base estrita no
Protocolo, o Comitê não poderia expedir Medida Temporária com esse
teor de requisição liberatória. Só pode expedir Posição Final
depois que o país signatário responder à notificação do Comitê.
No
entanto, o Regulamento do Comitê (que é outra norma jurídica)
prevê essa possibilidade das Medidas Temporárias em casos
especiais, de urgência, e de dano irreparável.
Isso
está claramente estabelecido no Comentário Geral n. 33 (2008),parág 19 em diante.
O
problema formal que se coloca, portanto, não é da competência do
Comitê para expedir tal comunicado ao Brasil. Isso o Brasil mesmo
autorizou.
A
questão é saber se é válido no Brasil um ato voluntário de
compromisso internacional com Direitos Humanos de iniciativa
legislativa da Presidência sendo esse ato não promulgado por
Decreto Presidencial, mas só referendado por Decreto Legislativo do Congresso Nacional.
A
Ratificação e o Depósito do ato perante a ONU foram realizadas por
decisão terminativa do Congresso Nacional. A iniciativa de
ratificação foi do Poder Executivo.
Não
há lei brasileira ou regra constitucional que condicione a validade
desse tipo de ato internacional à edição de um Decreto da
Presidência da República.
Isso
é "procedimento convencional" interno do Brasil. Coisa da
praxe política interna num país de da tradição da Civil Law, onde
só a lei obriga a fazer ou não fazer alguma coisa (CF, Art. 5o.
II).
As
convenções da praxe política, portanto, podem ser mudadas sem ato
legislativo formal.
A
meu ver, o transcurso de 9 anos sem oposição da Presidência da
República são mais do que suficientes para reconhecer a
AQUIESCÊNCIA da Presidência.
Não
é razoável interpretar esse compromisso internacional de outro
modo.
Aqui
estamos diante de um caso difícil de conflito entre uma orientação
liberal dada por Organismo Internacional, cuja competência para
decidir sobre os direitos de um Pacto é reconhecida pelo Brasil, e
uma orientação mais restritiva dada pelo direito interno, cujas
regras privam um brasileiro de exercer seus direitos políticos.
A
decisão do Organismo Internacional foi dada em caráter provisório.
O propósito é evitar que um dano irreversível ocorra aos direitos
políticos de Lula.
Se
considerarmos todas as decisões judiciais já proferidas contra
Lula, parece precipitado, à primeira vista.
Mas
considere que esse organismo analisa casos de violações de direitos
políticos de vários países do mundo e que, neste caso Lula, pesam
contra a posição mais restritiva adotada pelo Brasil o fato de que
Lula está sendo privado de seus direitos políticos (privação, não
restrição apenas) sem que o novo regime de sua prisão tenha sido
validado, de modo definitivo, pela Justiça do Brasil em controle
abstrato. Lembre que o tema da prisão em segunda instância ainda
aguarda o julgamento de duas ADCs no STF - sobre a
constitucionalidade do Art. 283 do CPP, que não autoriza prisão em
2o instância, sem trânsito em julgado.
Pra
piorar as coisas, o réu cumpre pena fora do sistema prisional. Está
acomodado provisoriamente na sede na Policia Federal.
Como
explicar a um Organismo Internacional que o Devido Processo está
sendo observado neste caso? É difícil.
Note:
o réu cumpre pena num regime novo de prisão (prisão sem o transito
em julgado da decisão condenatória), e contra esse novo regime há
duas ADC ajuizadas pela OAB-Federal ainda pendentes de julgamento. E
o réu está preso fora do sistema prisional, numa instalação
improvisada na sede da Policia Federal.
Junto
disso, as eleições e o risco de dano irreparável aos direitos
políticos de Lula.
Parece-me
que apesar de a Ratificação do Protocolo que embasou a decisão do
Comitê ter sido feita sem o Decreto Presidencial, a Presidência o
aceitou. Há quase uma década que a ratificação foi feita. O ato é
válido. E o Brasil o incorporou ao direito interno.
O
Brasil pode agora, em cima da hora, denunciar esse ato se quiser.
Pode, mas não deve. Não podemos brincar com o sistema internacional
de tratados e compromissos assumidos voluntariamente.
O
Brasil tem obrigação jurídica de aceitar as decisões desse
Comitê, pois o caso é de reclamação individual depois de
esgotadas as instâncias recursais internas e as circunstâncias da
prisão são atípicas para o direito brasileiro. Além disso, a
interpretação dos tribunais sobre sua validade desse regime de
prisão ainda não é definitiva.
A
dúvida, no sistema internacional de direitos humanos, favorece o
réu.
Se
o Brasil não aceitar a decisão provisória, isso equivale a uma
DENUNCIA do Protocolo Facultativo. E no inicio de um processo
eleitoral, o custo político de uma Denúncia desse compromisso
voluntário com direito humanos seria altíssimo.
Se
o Brasil aceitar a decisão provisória, isso equivale a uma
afirmação dos compromissos do Brasil com o Sistema de Direitos das
Nações Unidas, com a governança global.
Se
Lula puder exercer seus direitos políticos, mesmo na condição de
preso, a Democracia brasileira terá seu maior teste de resiliência.
O
STF pode julgar a ADC 43 e 44, e acabar com a dúvidas jurídicas
sobre o regime de prisão em segunda instância. Os eleitores podem
dizer, nas urnas, se desejam, ou não, um Presidente condenado pela
Justiça.
Essa
é a pedra no caminho da democracia do Brasil, neste ano de 2018.
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