PEC 342/09 quer alterar a forma de composição do Supremo Tribunal Federal

Prezado Prof. Strapazzon,
Estava dando uma lida em uns artigos e vi um que me chamou muito atenção. É sobre a PEC 342/09, do deputado Flávio Dino (PC do B - MA), que visa uma mudança na forma de escolha dos ministros do STF e estabelece um mandato de 11 anos a eles.

O projeto sugere que os futuros ministros sejam escolhidos a partir de uma lista tríplice elaborada pelo STJ, pelo TST, pelo Conselho Nacional de Justiça, Conselho Nacional do Ministério Público, OAB e pelas Faculdades de Direito, desde que tenham programa de doutorado há pelo menos 10 anos. Porém a PEC não é clara sobre a forma de elaboração de lista, isto é, se todos terão o mesmo peso para indicar os nomes ou se será feita uma eleição proporcional.

A partir dessa lista caberá ao Presidente indicar 5 ministros, a Câmara dos Deputados 2, ao Senado 2 e os outros 2 pelo próprio STF.

Essa primeira parte do projeto é bem interessante, pois acaba com a competência exclusiva do Presidente para escolher os ministros, ou seja, garante um Supremo mais plural.

Entretanto o que me deixou em dúvida foi à segunda parte da PEC que trata da questão de estabelecer um mandato para os ministros. Foi por isso que resolvi escrever esse e-mail, pois acredito que seria inconstitucional estabelecer um mandato para os ministros, visto que, eles gozam da garantia constitucional da vitaliciedade (art. 95, I, da CF). E mais, o fato dos ministros terem sua permanência limitada por um mandato poderia atrapalhar o funcionamento do STF. O senhor concorda com as essas afirmações? Grato pela atenção,Ramon P. Bentivenha. (3o período, Faculdade de Direito de Curitiba)

RESPOSTA
Olá Ramon, obrigado pelo seu e-mail.
Vejo uma certa confusão de conceitos nessa PEC.

Primeiro as questões democráticas misturadas com as republicanas. Na justificação da PEC e também num artigo postado no site do deputado, pode-se ver que ele quer democratizar o STF, muito mais do que republicanizá-lo.

Veja que ele acusa o Supremo de exercer atividades legislativas por meio da elaboração de súmulas vinculantes e pelo ativismo judicial diante de omissões legislativas declaradas inconstitucionais. O STF, para ele, é órgão legislativo. Tanto que ironiza com a expressão tricameralismo legislativo.

Então, se o STF legisla, entende que precisa ser mais plural, representativo. Típicos valores democráticos. Também quer um STF sem a vitaliciedade. Diz que 11 anos de mandato pode assegurar um caráter mais republicano à Corte, mais do que a vitaliciedade.

Eu não ignoro a relevância da discussão, bem como a boa intenção do parlamentar. É preciso respeitar também seu empenho em citar Louis Favoreau, ex-ministro da Corte Constitucional da Boznia Herzegovina e fundador da celebre revista francesa de direito constitucional.

O que não me agrada é essa confusão, feita pelo Deputado, entre Corte Constitucional e Supremo Tribunal.

Note que ao falarmos de Supremo Tribunal Federal, falamos de um órgão do Poder Judiciário. Na verdade, a última instância desse Poder. Assim, é evidente que o principio da vitaliciedade do art. 95,I protege os Ministros do Supremo.

São juízes!

A vitaliciedade e a irredutibilidade de vencimentos são consideradas as duas mais relevantes garantias da imparcialidade da função dos juízes. São celebres os Artigos 78 e 79 de Alexander Hamilton a esse respeito, publicados n' Os Artigos Federalistas.

Entendo, por isso, que uma Emenda Constitucional que altere substancialmente a garantia da vitaliciedade dos ministros do Supremo, ameaça esses valores, compromete esse entendimento já secular das democracias constitucionais.

Também entendo que essa PEC, assim, estará agredindo um elemento essencial da separação dos poderes e, portanto, está a agredir o art. 60 parágrafo § 4º, III.

Na Alemanha, na Espanha, na Itália e mesmo em Portugal o órgão guardião da Constituição não é um Supremo Tribunal. Se aqui, como nos EUA, o órgão defensor da Constituição também atua como última instância do Judiciário, nos sistema tradicionais desses países citados, a Corte Constitucional não pertence, rigorosamente,ao Poder Judiciário. É órgão autônomo.

Isso ocorre até mesmo na Alemanha, que tem um Tribunal Constitucional Federal previsto como parte do Judiciário mas que, na prática, se comporta como órgão autônomo. Idem para Portugal.

As Cortes Constitucionais tendem a ser órgãos especializados em julgamentos de casos exclusivamente constitucionais. Não são vocacionados para ser tribunais de última instância, como é o caso do STF.

Diante disso, como nosso STF é tribunal de última instância e ao mesmo tempo tem funções de Tribunal Constitucional e de Tribunal da Federação, é claramente um órgão do judiciário. Nosso modelo exige, assim, o respeito à regra da vitaliciedade, como nos EUA.
Assim como está, a PEC não retira o STF do Poder Judiciário e incorre, a meu ver, em violação às cláusulas pétreas por violar o art. 95,I da Constituição da República.

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