AJUSTE FISCAL E REPERCUSSÕES NOS DIREITOS DE SEGURIDADE SOCIAL

O CENÁRIO GERAL DAS MUDANÇAS NO REGIME GERAL DA PREVIDÊNCIA, PELAS MP 664, e MP 665, de 30.12.2014 e MP 668, de 30.01.2015

BREVE INTRODUÇÃO

Primeiramente, o sistema previdenciário adotado no Brasil é o de repartição simples, que consiste num modelo no qual os recursos recolhidos dos contribuintes atuais são destinados a cobrir os gastos com os aposentados de hoje. Nesse sistema não existe acumulação das contribuições para garantir o pagamento da aposentadoria do próprio segurado contribuinte, como ocorre no sistema de capitalização.
A Previdência Social paga mensalmente cerca de 32,2 milhões de benefícios em todo o País, sendo 18,7 milhões na área urbana (58,1% do total), 9,2 milhões na área rural (28,5%) e 4,3 milhões de benefícios de caráter assistencial (13,4%). No  período  de  1995  a  2014,  a  participação  da  arrecadação  líquida  previdenciária  e  da  despesa  com  benefícios  previdenciários em relação ao PIB passaram de 4,6%, em 1995, para 6,5% e 7,6%, em 2014.
O aumento da quantidade de benefícios previdenciários (previdenciários e acidentários) pagos veio acompanhado da melhoria do valor médio real destes, que chegou a R$ 959,15, em dezembro de 2014, um crescimento de 58,9% em relação ao mesmo mês de 1995.
A combinação entre o aumento da quantidade de benefícios e o incremento do valor médio condicionou ao aumento da despesa total, que atingiu R$ 403,5 bilhões em 2014, aumento de 104,6% (+R$ 206,3 bilhões), quando comparado ao ano de 2003.
A arrecadação líquida previdenciária teve elevação superior as despesas previdenciárias, de 132,2% (+R$ 196,7 bilhões), ou seja, chegou, em 2014, a R$ 345,4 bilhões. Mesmo com esse forte crescimento da arrecadação líquida previdenciária nesse período, reflexo do bom desempenho do mercado de trabalho formal, o resultado foi uma necessidade de financiamento de R$ 84,0  bilhões. Isso porque a despesa com benefícios previdenciários urbanos foi de R$ 312,7 bilhões e a despesa com benefícios previdenciários rurais  foi de R$  90,8  bilhões, enquanto a arrecadação líquida foi de R$345 bilhões.
Estima-se que participação dos idosos na população total deverá crescer de 11,3%, em 2014, para 33,7% em 2060. Por isso, o crescimento da despesa, do atual patamar de 7,6% deve se elevar para cerca de 13% em 2050.
A despesa bruta com pensão por morte no âmbito do RGPS cresceu do patamar de R$ 39 bilhões, em 2006, para R$ 86,5 bilhões em 2013 e, portanto, mais que dobrou em valores nominais no período (alta de 121,5%), com um crescimento médio anual de cerca de 12% a.a.. Em termos da despesa, os pagamentos com pensão passaram de 1,6% do PIB, em 2006, para cerca de 1,8% em 2013, apenas considerado o RGPS.
No caso do auxílio-doença, a despesa bruta cresceu de R$ 14,2 bilhões, em 2006, para cerca de R$ 22,9 bilhões, que representou uma alta relativa de 60,6% no período.
Em 2013, as despesas com abono salarial e seguro desemprego somaram R$ 31,9 bilhões e R$ 14,7 bilhões, respectivamente.
Por outro lado, aumentou o emprego e a formalização: 15,5 milhões no setor privado de 2003 a 2013.
A base de segurados da previdência aumentou em 30 milhões entre 2003 e 2013
De 2003 a 2014 o Salário Mínimo (base para todo o sistema de proteção social)
teve aumento real de 73%.
A sobrevida dos brasileiros aumentou em média 4,4 anos em 13 anos
No geral, aumentou a expectativa de vida do brasileiro em 12,4 anos, tendo passado de 62,5 anos para 74,9, entre 1980 e 2013.

MUDANÇAS ESTABELECIDAS PELAS MP 664 E 665 DE 2014 E 668/2015.

MP 664, 30.12.2014, aprovada pelo CN e remetida à sanção presidencial em 28.05.2015. Altera diversos benefícios da Previdência Social e do Regime Próprio dos Servidores Públicos; muda a forma de cálculo da pensão por morte, inclui carência para sua concessão e estabelece tabela de duração em função da idade do beneficiário; estabelece teto para o valor do auxílio-doença e aumenta o intervalo de tempo a ser suportado pela empresa empregadora; altera rol de beneficiários; estende prazo para requerimento de compensação financeira entre os regimes previdenciários.

MP 665, 30.12.2014. aprovada pelo CN e remetida à sanção presidencial em 27.05.2015.Aumenta a exigência do tempo de permanência dos trabalhadores no ano-base para concessão do abono salarial; altera as exigências para a primeira e segunda solicitação do benefício do seguro-desemprego; altera o seguro-desemprego destinado aos pescadores artesanais em período de defeso para tornar mais claro o enquadramento para fins de concessão do benefício pecuniário, diferenciando aqueles que vivem exclusivamente da pesca daqueles que exercem outras atividades profissionais.

MP, n. 668 de 30.01.2015. Aumenta as alíquotas da Contribuição para o PIS/PASEP-Importação e da COFINS-Importação incidentes sobre: entrada de bens estrangeiros no território nacional; importação de alguns produtos farmacêuticos; alguns itens de perfumaria, de toucador ou de higiene pessoal; de máquinas, veículos e autopeças; pneus novos de borracha, câmaras-de-ar de borracha; e papéis destinados para impressão de periódicos. Permite o uso de valores oriundos de constrição judicial, depositados na conta única do Tesouro Nacional até a edição da Medida Provisória n° 651/2014, para pagamento da antecipação referente à adesão a programas especiais de parcelamento de créditos com a Fazenda Pública.

PRINCIPAIS MUDANÇAS

AUXILIO DOENÇA (caso de incapacitação temporária para o trabalho)
Valor do benefício não poderá exceder a média das últimas 12 contribuições (antes era dos 80% maiores salários de contribução).
A empresa paga ao empregado o salário integral durante os primeiros 30 dias de afastamento (desde 1960, a empresa pagava apenas os primeiros 15 dias)
Previsão de convênios, sob supervisão do INSS, com empresas que possuem serviço médico, órgãos e entidades públicas (antes todas as perícias médicas eram realizadas exclusivamente por médicos do INSS).

PENSÃO POR MORTE (caso de falecimento do segurado)
Tempo mínimo de 2 anos de contribuição para acesso à pensão previdenciária por morte (antes não havia tempo mínimo de contribuição), exceto casos de acidente de trabalho e doença profissional.
Tempo mínimo de 2 anos de casamento ou união estável, exceto casos de acidente de trabalho e doença profissional. (antes não havia tempo mínimo de contribuição, nem de casamento)
Fim do benefício vitalício para cônjuges jovens (agora adota-se tabela progressiva de tempo de recebimento do benefício). A concessão do benefício vitalício é apenas para para cônjuges com 44 anos ou mais, ou seja, para quem tem expectativa de sobrevida de até 35 anos.
Conjuge sem filho recebe 60% do valor da aposentadoria recebida pelo falecido; com 1 filho, cônjuge recebe 70%; com 2 filhos recebe 80%, com 3 filhos recebe 90% e com 4 filhos ou mais, recebe 100% do valor da aposentadoria recebida do segurado falecido.

AUXÍLIO-RECLUSÃO
Atualmente não tem carência, mas também passa a exigir dois anos de carência, pois sua regra de cálculo é idêntica ao cálculo do benefício da pensão por morte.

SEGURO DEFESO (caso de benefício de 1 salário mínimo pago a pescadores artesanais sem outra fonte de renda)
Registro do pescador deve ser com o tempo de antecedencia mínima de 3 anos (antes era 1 ano);
Fica proibido acumular o Seguro Defeso com outros beneficios assistenciais e previdenciários de natureza continuada (exceto pensão por morte e auxilio doença). Antes era proibido acumular apenas outros beneficios previdenciários.
Dever de comprovar comercialização da produção, ou recolhimento previdenciário, por no mínimo, 12 meses.
Pagamento máximo do mesmo número de parcelas do seguro desemprego.
O objetivo é tornar mais claro o enquadramento para fins de concessão do benefício pecuniário, diferenciando aqueles que vivem exclusivamente da pesca daqueles que exercem outras atividades profissionais. 

ABONO SALARIAL (pago ao trabalhador que recebeu, em média, até 2 SM no ano-base).
Exigência de comprovação de haver trabalhado por, no mínimo, 180 dias ininterruptos no ano-base (antes era 30 dias).
Cumprido o período mínimo, agora o pagamento é proporcional ao tempo trabalhado, como o 13o. salário.
A interpretação do governo é que quando o abono foi inserido na Constituição Federal de 1988 o objetivo era beneficiar os trabalhadores menos abastados. Porém, a política de valorização do salário mínimo fez com que esse benefício incidisse menos sobre a população mais pobre e, por consequência, tornou-se menos progressivo nos últimos anos.

SEGURO DESEMPREGO (benefício pago ao trabalhador demitido sem justa causa. Valor de R$788 (SM) a R$1.385,91)
Exige-se tempo minimo de trabalho de 18 meses, nos últimos 24 meses, na primeira solicitação; 12 meses, nos últimos 16 meses, na segunda solicitação; a partir da 3a. solicitação, 6 meses de trabalho ininterrupto (antes era exigido apenas 6 meses de trabalho ininterrupto).
Referida alteração tem o objetivo de beneficiar os trabalhadores mais vulneráveis em detrimento daqueles que solicitam o benefício pela primeira vez. Cabe destacar que este último grupo respondeu por 72,8% do total de benefícios concedidos em 2013.

AUMENTO DE ALÍQUOTAS DE CONTRIBUIÇÕES À SEGURIDADE SOCIAL
O PL de Conversão n. 6/2015, resultado de alterações na Medida Provisória 668/2015, elevou a alíquota do PIS/Pasep de 1,65% para 2,1%. A Cofins sobe de 7,6% para 9,65%. No total, a soma das contribuições passa de 9,15% para 11,75%. As mudanças propostas e a elevação de algumas alíquotas devem gerar uma arrecadação adicional de R$ 694 milhões em 2015 e de R$ 1,19 bilhão ao ano a partir de 2016.

CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DAS REFORMAS DA PREVIDÊNCIA

A Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Anfip) ajuizou, em 25.02.205, Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5246, no Supremo Tribunal Federal (STF), em que questiona a edição e o conteúdo da Medida Provisória (MP) 664/2014, que alterou critérios para a concessão de benefícios da seguridade social. Segundo a entidade, a MP instituiu, na prática e “por via oblíqua e imprópria”, verdadeira reforma previdenciária. A Anfip pede liminar para suspender os efeitos da norma até o julgamento do mérito da ADI, que tem como relator o ministro Luiz Fux.

Na ação, a Anfip afirma que não há, no caso, os requisitos de urgência e relevância necessários para a edição de medidas provisórias. Afirma ainda que não foi observado o artigo 246 da Constituição Federal, que impede a adoção de medida provisória para regulamentar artigo da Constituição cuja redação tenha sido alterada por meio de emenda promulgada entre 1º/01/1995 e a publicação da Emenda Constitucional 32, de 2001. Por tais razões, a Anfip alega que a MP possui inconstitucionalidade formal.

Já com relação à alegada inconstitucionalidade material da MP, a Anfip afirma que as modificações na seguridade social introduzidas por seu texto alteram a Lei 8.112/1990 (que dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União), em violação ao “princípio da proibição do retrocesso social”. Entre as modificações que, segundo a Anfip, desrespeitam os ditames constitucionais, está o estabelecimento de carência de 24 contribuições para que os dependentes do servidor falecido recebam pensão por morte.

Do mesmo modo, o Partido Socialista Brasileiro (PSB) ajuizou ação no Supremo Tribunal Federal (STF) para questionar as Medidas Provisórias (MPs) 664 e 665, ambas editadas em 2014, que preveem mudanças nas leis previdenciárias e trabalhistas. As MPs estão sendo contestadas por meio da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5280, ajuizada pelo partido político e que foi distribuída para o ministro Luiz Fux, que já possui sob sua relatoria outras ações sobre o tema.

O PSB pede a concessão de medida liminar para suspender os efeitos das MPs por considerar que elas violam princípios constitucionais, como os previstos no artigo 62 da Constituição Federal, que trata dos critérios de relevância e urgência para edição de medidas provisórias, e 246, uma vez que direitos trabalhistas e previdenciários não poderiam ser alterados por medida provisória. “O artigo 246 da Constituição Federal restringe a faculdade de expedir medidas provisórias a partir de critério totalmente objetivo, isto é, a impossibilidade de regulamentar norma constitucional cuja redação tenha sido alterada por emenda constitucional entre 1º de janeiro de 1995 até 11 de setembro de 2001”.
Além disso, a Associação Nacional dos Médicos Peritos da Previdência Social (ANMP) ajuizou no Supremo Tribunal Federal (STF) a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5272, com pedido de medida liminar, questionando parte dos artigos 1º e 2º da Medida Provisória (MP) 664/2014, que modificou normas sobre a contratação de médicos terceirizados e empresas conveniadas para exercerem perícia médica da Previdência Social.

A MP, no seu artigo 1º, incluiu o parágrafo 5º no artigo 60 da Lei 8.213/1991 e, em seu artigo 2º, excluiu o termo “privativamente” do artigo 2º da Lei 10.876/2004. Segundo a associação, as modificações permitem que médicos terceirizados e empresas privadas conveniadas ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) exerçam atividades típicas de Estado, desempenhadas pelos integrantes da carreira de peritos médicos da Previdência Social, que consistem na averiguação do direito à percepção de benefícios previdenciários.

A ANMP defende ainda que a atividade desenvolvida no âmbito do INSS é típica de Estado e, por essa razão, não pode ser delegada a terceiros. Salienta também que a exceção à exigência constitucional do concurso público, prevista no inciso IX do artigo 37, compreende as contratações por tempo determinado para atender necessidade temporária de excepcional interesse público (contratos temporários).



Fontes:
Exposição de motivos das MP 664, 665 e 668
Site do Senado Federal
Site do Supremo Tribunal Federal
Site do Ministério da Previdência Social


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