1854 - RELATÓRIO ZACARIAS GÓES E VASCONCELLOS - EMANCIPAÇÃO POLÍTICA DO PARANÁ - PARTE IV


(Em cima). Quadro da Primeira Sessão da Assembléia Legislativa da Provincia do Paraná. 1854.
Quadro debaixo. Pintura de Jean Baptiste Debret, Paisagem de Paranaguá. Primeira metade do século XIX.


BAÍA DE PARANAGUA E PORTO DE ANTONINA (p.79-82)
Zacarias relata que em 1º. de outubro de 1853 foi criada uma capitania no porto de Paranaguá, pelo decreto 1.241. Informa que pediu um estudo e a elaboração de uma planta de navegabilidade do Porto de Antonina. Recebeu a informação de que “o Porto de Antonina admite qualquer navio que entrar na barra de Paranaguá”. Além disso, noutro relato que lhe foi enviado, informam que o Porto de Antonina pode receber qualquer navio de comércio ou de guerra, no preamar. Zacarias faz enfática defesa da necessidade de utilizar mais o porto de Antonina, e, assim, evitar a prática corrente de as importações chegarem em Paranaguá e subirem, depois, o rio até Morretes. Isso, a seu ver, era um desperdício de tempo e recursos.

OS LIMITES DA PROVINCIA DO PARANÁ COM SANTA CATARINA (p.83-86)
Inicia reclamando que a Província de São Paulo legou aos paranaenses “a incerteza de seus limites”. Zacarias comenta, em seguida, que um deputado catarinense propôs que a divisa com Santa Catarina seja o Rio Negro. Mas alerta para a situação estranha que restaria disso, já que a comunidade de Rio Negro seria dividida em duas, o que, a seu ver, provocaria estupefação aos moradores do local.
Alerta que o rio Yguassú não pode ser o divisor dos territórios sob pena de toda a região dos campos de Palmas, descoberta por paranaenses, ficaria do lado catarinense.
Informa a Assembléia que outra proposta em discussão, em 1842, era dividir as duas províncias pelo Rio Canoinhas. A seu juízo isso seria menos prejudicial ao Paraná, mas ainda assim não seria justo, pois “acarretaria a perda de muitos campos descobertos e povoados por filhos desta província”.
Seu relatório se restringe a esclarecer quais eram as propostas em discussão, e quais não deveriam ser aceitas pela Assembléia. Recomenda, por fim, que os Deputados do Paraná peticionem ao Imperador pedido solução para este impasse.
AS ESTRADAS DA PROVINCIA DO PARANA (p.86-99)
“A primeira necessidade desta província é, decididamente, o melhoramento de suas vias de comunicação”. Esta frase de abertura parece suficientemente clara para informar o estado das 16 estradas paranaenses da época. Neste tópico do relatório há algumas passagens que, pela importância histórica, merecem ser transcritas. São as seguintes:
Em virtude da recomendação do governo imperial, e cônscio de tão urgente necessidade, no dia seguinte ao em que tomei posse da administração, expedi ordem ao tenente coronel de engenheiros Henrique Beaurepaire Rohan, para que, com a possível brevidade, examinasse as estradas, (...) especialmente a da Graciosa, que comunica a vila de Antonina com esta cidade, informando qual fosse mais vantajosa (...).
(...)
Três são as estradas, por onde atualmente faz-se a comunicação entre as povoações de serra-acima com o litoral, e vice-versa, a saber: a da Graciosa, a de Ytupava e a do Arraial [em S. José dos Pinhais]. Sabe toda a província que nenhuma dessas estradas presta-se, em seu estado atual, à rodagem (...). A da Graciosa não, porque ainda que apanhe a serra em excelente localidade e sua posição fosse escolhida com inteligência (...) apresenta, em alguns lugares, declives de 28º.; não a de Ytupava, porque tem declives de 40º; não a do Arraial, porque, como as outras, é de defeituosa construção, na tendo nem 10 palmos no perfil transversal, e apresentando inclinações longitudinais inacessíveis ao carro.
(...)
Os dados (...) dão todos à picada da Graciosa uma superioridade incontestável relativamente à do Ytupava.

Em relação a outras estradas, explica Zacarias:

Como não vos é estranho, a Estrada Geral, que de São Paulo dirige-se às províncias de Santa Catarina e Rio Grande do Sul, atravessa a nova província na direção média de N.S. passando sucessivamente pela vila de Castro, freguesias da Ponta-Grossa e Palmeira, vila do Príncipe e Freguesia do Rio Negro, com ramificações ao Ocidente e Oriente.

Assim, havia 4 estradas muito importantes no Paraná: as três “picadas” da Graciosa, Ytupava e Arraial, e a “Estrada Geral” ---por onde passava o gado e os muares vindos de Viamão-RS.
Além dessas, o relatório do Presidente da Província do Paraná menciona outras 8 estradas que, como as primeiras, estavam todas em péssimo estado e necessitando de benfeitorias, devido à utilidade que tinham:
5) Uma ramificação que ligava Ponta Grossa a Guarapuava (trecho aberto por volta de 1820), depois cruzava o Rio Yguassú e os campos de Palmas em direção a Missões do Rio Grande do Sul;
6) Outra picada foi aberta para ligar Guarapuava ao rio Paraná e o Paraguai. Era uma picada, já apagada.
7) Outro caminho partia de Palmeira e terminava em Palmas. Estava em péssimo estado mas era muito melhor que o de Guarapuava. Noutros tempos havia sido muito utilizado para o comércio de sal e animais com as Missões do RS.
8) Havia também uma ramificação que ligava Guarapuava e Ponta Grossa à Colônia Tereza (atual Cândido de Abreu, no centro do Estado);
9) Outra estrada ligava Castro à “picada” da Graciosa;
10) Havia uma outra estrada que partia de Castro para o Porto de Jatahy, importante para a ligação com o Mato Grosso.
11) Também havia uma estrada que ligava Castro a São Francisco do Sul, em Santa Catarina;
12) E, por fim, havia um péssimo caminho que ligava a vila de Ribeira-SP a Curitiba.

O PAÇO (PALÁCIO) DA ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DA PROVÍNCIA DO PARANÁ (p.99)
Zacarias relata que a primeira sede da Assembléia Legislativa do Paraná foi uma casa em Curitiba “não acabada, mas vasta o suficiente para o que se queria”, adquirida do Comendador Roseira (Manoel Gonçalves de Moraes Rozeira), fazendeiro de S.J. dos Pinhais, deputado provincial e influente político da época.
Como não foi possível reformá-la em tempo, a primeira sessão de trabalhos da Assembléia Legislativa da Província do Paraná realizou-se na Câmara Municipal de Curitiba.

ESTATÍSTICA (p.100-101)
Zacarias reclama muito da metodologia utilizada para coleta e tratamento dos dados sobre a população local. Apesar disso, comenta os relatórios que foram elaborados pelos encarregados. Diz, sinteticamente, o que consta da introdução desta análise, no primeiro tópico após a biografia de Zacarias, ao qual remeto o leitor.

COMPILAÇÃO DAS LEIS DA PROVINCIA (p. 101)
Zacarias limita-se a dizer que era necessário formar uma comissão de estudos para compilar as leis da província de São Paulo ainda aplicáveis ao Paraná. Nada disso ainda havia sido feito.

FAZENDA DA PROVÍNCIA DO PARANÁ (p. 101-109)
Zacarias relata, rapidamente, que contratou pessoal específico para administrar o dinheiro da província, que eram pessoas de sua confiança e com experiência; em seguida remete os Deputados à análise de documentos que anexa ao seu relatório. Tais documentos versam sobre a gestão dos gastos provinciais e estão disponíveis no final do documento.
Neste tópico financeiro Zacarias menciona que “os cofres da província não tinham dinheiro algum quando se instalou, nem mesmo para pequenas necessidades”, o que o forçou a solicitar um “empréstimo da caixa geral”, isto é, do governo central. Em vista de tal situação, a Província já acumulava um déficit importante em seus primeiros 7 meses de existência, déficit que tendia a aumentar.
Diante disso, recomenda a criação de impostos sobre passagem nas entradas e saídas da Província, em especial sobre o transporte de gado que vinha de “São Pedro do Rio Grande do Sul”. No entanto, não tinha uma decisão sobre como aumentar as receitas, apenas apresenta o problema e um meio para resolvê-lo. Deixa para a Assembléia a responsabilidade de encontrar um meio de aumentar a arrecadação da Província. Isso foi muito coerente com seus ideais liberais, já que os principais pagadores de impostos da província estavam nessa Assembléia.

BARREIRAS DA PROVINCIA DO PARANÁ (p.109-110)
Zacarias informa que havia três barreiras que cobravam passagem: a da estrada da Graciosa, a do caminho do Ytupava e a do Rio do Pinto. Em cada uma havia um administrador que recebia pagamento para fazer benfeitorias nelas.

TEXTO DE ENCERRAMENTO DO RELATÓRIO – NA ÍNTEGRA (p.110)

Termino aqui este relatório, imperfeito pelas circunstâncias em que me ache e poucos recursos à minha disposição, e mais imperfeito ainda por falta de perícia de quem o escreveu; mas fico persuadido de que vós, olhando mais para minhas intenções, e boa vontade, do que para o resultado de meus esforços, sereis indulgentes para comigo.
A vossa tarefa, senhores, é árdua, e eu reconheço-me um auxiliar impróprio para tamanha empresa.
Não importa: metamos mão à obra.
A legislação de uma província não é trabalho de uma só assembléia nem de uma só administração, é um edifício do futuro para o qual cada assembléia e cada administração conduzem alguma pedra.
Se, obreiro desjeitoso, eu não souber ajudar-vos na primeira pedra, que aqui vindes lançar, não me negareis, ao menos, o sincero desejo de inscrever nela estas palavras --- CONCORDIA E PROSPERIDADE DO PARANÁ.

Curytiba, em 15 de julho de 1854.

ZACARIAS DE GÓES E VASCONCELLOS.
Typographia Paranaense de C. M. Lopes --- 1854

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