CORRUPÇÃO GENERALIZADA DA CLASSE POLÍTICA, LÁ E CA....

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Por Perry Anderson, 
Professor de história e sociologia da Universidade da Califórnia em Los Angeles, USA.   
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A Europa está doente.



Quanto sério é isso, e por quais motivos, são questões nem sempre fáceis de avaliar. Mas dentre os sintomas, três são visíveis, e inter-relacionados. O primeiro, e mais familiar, é a degeneração da democracia em todo o continente, de que a atual estrutura do União Europeia é, ao mesmo tempo, causa e conseqüência.



O molde oligárquico do seu arranjo constitucional, concebido como armação provisória para uma posterior soberania popular de escala supranacional, tem se enrigecido de forma constante ao longo do tempo. Os referendos são regularmente invertidos se contrastam com a vontade dos governantes. Os eleitores cujos pontos de vista são desprezados pelas elites evitam o conjunto que os representa nominalmente, e a presença às urnas vem caindo a cada eleição sucessiva. Burocratas que nunca foram eleitos supervisionam os orçamentos dos parlamentos nacionais despossuídos, até mesmo de poderes de decidir sobre gastos públicos. Mas a União não é uma excrescência dos Estados membros que, de outro modo, poderiam ser até bem saudáveis. Reflete, tanto quanto aprofunda, tendências de longo prazo entre eles. A nível nacional, praticamente em todos os lugares, os executivos domesticaram ou manipulam os legislativos com a maior facilidade; os partidos perdem membros; os eleitores perdem a crença de que eles servem para algo, à medida em que as escolhas políticas se restringem e as promessas de rumos diferentes apresentadas nos palanques diminuem ou desaparecem nos gabinetes de seus oficios.          



Com essa involução generalizada adveio também uma corrupção generalizada da classe política, um tema sobre o qual a ciência política, bastante opinativa quanto ao que, na linguagem dos contadores, se tem chamado de déficit democrático da União Europeia, tem ficado em silêncio. As formas dessa corrupção ainda têm de encontrar uma taxonomia sistemática. Há uma corrupção pré-eleitoral: o financiamento de pessoas ou partidos a partir de fontes ilegais - ou legais - em face de promessa, expressa ou tácita, de favorecimentos futuros. Há uma corrupção pós-eleitoral: o uso do cargo para obter dinheiro a partir da malversação de receitas, ou propinas em contratos. Não há compra de vozes ou votos nas legislaturas. furto simples do erário público. um falseamento das credenciais para fins políticos. enriquecimento a partir de cargos públicos tanto dos mandatos, bem como durante ou antes dele. O panorama deste malavita é impressionante. Um afresco disso poderia começar com o caso de Helmut Kohl, primeiro-ministro da Alemanha por 16 anos, que acumulou cerca de dois milhões de marcos em caixa dois de doadores ilegais cujos nomes, uma vez que ele foi exposto, se recusou a revelar, por medo de os favores que tinha recebido virem à luz. Do outro lado do Reno, Jacques Chirac, presidente da República Francesa por 12 anos, foi condenado por desvio de fundos públicos, abuso de poder e conflitos de interesse, assim que a sua imunidade terminou. Mas não sofreu qualquer penalidade. Estes dois foram os políticos mais poderosos do seu tempo na Europa. Um olhar sobre a cena, desde então, é suficiente para dissipar qualquer ilusão de que esses casos eram exceção à regra.



O texto completo, em inglês, está disponível AQUI, na London Review of Books, vol.36, n.10, de 22.05.2014.

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